sexta-feira, 29 de março de 2013

Lendas do leito do rio Leça (Mosteiro de Leça do Balio)

Mosteiro de Leça do Balio

Ao consultar a obra do escritor Arnaldo Gama, cuja escrita nos apaixona pela forma soberba como descreve antigos lugares da cidade do Porto, e pelo encanto invulgar que confere à sua obra A Última Dona de S. Nicolau (em que descreve o que era um copista no século XVIII, e a transição para caracteres móveis inventada por Guttenberg, ele próprio um copista), dei por mim a reler O Balio de Leça, obra em que se explica que o mosteiro que hoje vemos foi outrora composto por quatro torres, e uma Quinta que se encontra nas traseiras, encostada ao Monte de Santana.

Fora do Mosteiro, em pleno adro, encontra-se um cruzeiro com Cristo crucificado, uma soberba obra atribuída a um frade a quem chamavam o Moço.
Perto do Mosteiro passava, e continua a passar, o rio Leça, navegável até à Ponte das Varas, que chegava – em tempo de cheias – a inundar os subterrâneos do dito Mosteiro. O escritor diz-nos que, no ano de 1324, os freires, à noite, faziam escapadelas pelo monte de Santana e assaltavam moças que viviam na encosta, o que fazia deles pouco hospitaleiros. Porém, também davam abrigo aos Cavaleiros da Ordem de Malta, principalmente aos que tinham visitado os lugares santos. Por lá passaram D. Álvaro Gonçalves Pereira, pai do Condestável D. Nuno Álvares Pereira, e o seu irmão que morrera na batalha de Aljubarrota, ao serviço de Castela.

O romancista presenteia-nos com lendas e factos. Entre outros episódios, conta que, no reinado de D. Dinis, Estêvão Gontines se queixou ao Balio Vasques Pimentel de que a sua mulher praticava adultério com um frei daquele hospital dos templários. Confrontada com esta suspeita, a mulher do ferreiro logo negou a infâmia de que se sentia vítima, e para provar a sua inocência, propôs-se colocar as mãos no fogo, punição logo aceite pelos frades ali presentes. Marcado o dia da penitência, foi o próprio marido Gontines incumbido de pôr o ferro no fogo, e de mostrar aos presentes que o ferro estava em brasa. As mãos da acusada foram, então, embrulhadas no ferro, e ao fim de determinado tempo, quando foram retirados os panos, verificou-se que as mãos da mulher estavam limpas, sinal da sua inocência. Esta é a lenda ou facto descrito por Arnaldo Gama, que está na base do dito popular: “Eu até punha as minhas mãos no fogo”. Este mesmo Balio foi sepultado a seu pedido na entrada do Mosteiro, por forma a que todos que lá entrem passem por cima da sua sepultura. 


Este mosteiro testemunhou também o casamento clandestino de D. Fernando e D. Leonor.

José Mendonça 
in Lendas do leito do rio Leça

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